Risco em alta: Milhões de pessoas usam cigarros eletrônicos no Brasil e só quem lucra é o mercado ilegal

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Rio de Janeiro – O Seminário “Cigarros Eletrônicos – Redução de Riscos e a Importância da Regulamentação”, realizado ontem no auditório do jornal O Globo no Rio de Janeiro, com apoio da Bat Brasil, mostrou especialistas de diversas áreas alertando sobre os problemas causados pela proibição do comércio de cigarros eletrônicos no país.

O evento contou com 6 palestrantes e teve moderação de Edward Pimenta, diretor do G.Lab, estúdio de conteúdo da Editora Globo. Com a presença de dezenas de espectadores no auditório, o seminário também ofereceu transmissão ao vivo pelo canal do Youtube e Facebook do O Globo e pelo Facebook e Linkedin do jornal O Valor Econômico.

Somente no Youtube o vídeo já conta com mais de 1.000 visualizações e pode ser conferido através deste link.

A iniciativa mostra o importante comprometimento da mídia, em especial de um dos principais veículos de imprensa do Brasil, ao realizar ações que tragam informações adequadas sobre um assunto para o público.

A primeira fala do dia foi feita por Lauro Anhezini Junior, chefe de assuntos regulatórios e científicos da BAT Brasil, fabricante de cigarros antigamente conhecida como Souza Cruz. Lauro deixou muito claro a postura da Bat Brasil, que considera que cigarros eletrônicos são produtos destinados exclusivamente a adultos e que em hipótese alguma devem ser consumidos por menores de idade, uma preocupação que foi vista em todas as comunicações do evento, alertando que o conteúdo era somente para maiores de 18 anos.

O cuidado é extremamente válido, já que o consumo de cigarros eletrônicos no Brasil realizado por jovens é já é expressiva e tem crescido anualmente, impulsionado por um mercado ilegal que não se importa com a idade do cliente para o qual vende.

O primeiro painel foi composto pela ex-diretora da Anvisa e consultora da Bat Brasil, Dra. Alessandra Bastos, Márcia Cavallari, CEO do instituto de Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) e Miguel Okumura, consumidor e criador do Podcast Vaporacast, que fala sobre “vaping”, o uso de cigarros eletrônicos. Foram apresentados dois pontos principais: o problema do mercado ilegal e o alto e crescente índice no uso dos produtos.

Nas palavras da Dra. Alessandra Bastos, o Brasil vive uma crise sanitária urgente, onde produtos sem qualquer regra sanitária ou controle são oferecidos livremente, apesar da proibição do comércio que existe desde 2009, definida pela RDC 46 da Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A ex-diretora da agência considera que “a proibição falhou”.

Em seguida, Márcia Cavallari apresentou números que comprovam que este parece ser o caso. O Ipec realiza anualmente uma grande pesquisa nacional com dados sobre tabagismo, com mais de 50.000 entrevistas que oferecem um panorama estatístico preciso sobre os hábitos da população brasileira. Os números mostram que de 2018 para 2022 a incidência de cigarros eletrônicos quadruplicou, com mais de 2 milhões de pessoas consumindo os produtos nos últimos 30 dias.

Além disso, o Ipec também mostra que 25% dos fumantes de cigarros convencionais já experimentaram os cigarros eletrônicos, o que representa 6 milhões de fumantes que tiveram contato com esses novos produtos.

“O comércio é proibido desde 2009 e em 2018 começamos a monitorar o uso e vemos um crescimento, então o estudo longitudinal permite analisar que políticas públicas devem ser adotadas. A gente vai ver esses dados evoluindo e não fazer nada?” – disse a CEO do Ipec.

Conforme Márcia Cavallaria salientou durante sua fala, estes números representam somente os consumidores adultos, sem contar menores de idade. Quando levamos em conta dados recentes publicados pelo O Globo que mostram que 1 em cada 4 adolescentes já experimentaram vaporizadores no Brasil, temos um cenário ainda pior.

Miguel Okumura mostrou o lado mais pessoal da questão, contando sua história como consumidor e como conseguiu parar de fumar somente graças aos cigarros eletrônicos, salientando sua dificuldade de ter garantia de qualidade nos produtos que consome e fazendo um apelo e uma cobrança para a Anvisa, que regulamente o comércio o mais rápido possível, já que se tratam de vidas que estão em risco consumindo produtos que não obedecem à nenhuma regra sanitária.

“Você acha que o mercado informal está preocupado para quem vende? Ele só quer vender. Nós consumidores precisamos de uma regulação. Enquanto esse pessoal [o mercado ilegal] está fazendo dinheiro, o consumidor está à mercê de sua sorte. É preciso pressa na regulamentação, pois isso seria bom para a população” disse Miguel Okumura em sua fala final.

Durante o segundo painel, realizado com a presença da advogada Carolina Fidalgo, a médica fisiatra Dra. Érika Suzigan e o economista-chefe da FIEMG João Gabriel Pio, foram abordados o processo regulatório da Anvisa sobre o assunto, os impactos na saúde e o custo direto e indireto da proibição na economia brasileira.

Destaque para a fala da advogada Carolina Fidalgo, que comentou sobre o relatório apresentado pela Anvisa em 2022, que considerou inviável uma regulamentação dos produtos no país, apesar de mais de 80 países provarem o contrário, como Inglaterra, Canadá, EUA e Suécia, considerados avançados em suas políticas de saúde pública.

A questão da saúde também foi tratada pela Dra. Érika Suzigan, que comentou sobre a dificuldade natural dos médicos de se manter sempre atualizados sobre todas as matérias e que ainda existem muitos profissionais brasileiros que não estão devidamente informados sobre redução de danos do tabagismo, uma estratégia que de acordo com a médica, pode ser aplicada em todas as áreas da medicina.

O economista João Gabriel Pio mostrou um cenário de grandes perdas para o Brasil, através de um projeto que liderou na FIMG – Federação das Indústrias de Minas Gerais, que calculou uma projeção dos números econômicos e o impacto financeiro da proibição do comércio de cigarros eletrônicos no Brasil.

A simulação realizada pela FIMG mostra que somente com arrecadação fiscal, o Governo Federal perde cerca de 2.2 bilhões de reais todos os anos, tomando como base alíquotas de imposto definidas pela própria Receita Federal, que curiosamente já definiu o percentual de imposto para os produtos, apesar de terem a importação e comércio proibidos.

“Qualquer pessoa pode digitar no Google por “simulador de tratamento tributário”, entrar no site da Receita Federal e digitar dispositivos eletrônicos de vaporização, para ter acesso às alíquotas e fazer o cálculo.” ironizou João Gabriel.

Além disso, há uma estimativa de um mercado de cerca de 7.5 bilhões de reais que já existe independente da permissão ou não da Anvisa. A regulamentação do comércio geraria um impacto positivo de 16 bilhões de reais na economia como um todo, criando mais de 100 mil postos de trabalho, com uma massa salarial gerada de 2.2 bilhões de reais e impostos líquidos de 673 milhões de reais.

Para colocar em perspectiva, João Gabriel fez alguns comparativos: os empregos gerados equivaleriam a quase 2 vezes o número de postos de trabalho formais criados em todo o setor agropecuário em 2022, os salários diretamente criados nessas novas vagas seriam de 2,7 vezes o orçamento do piso salarial dos agentes comunitários de saúde no ano passado e a arrecadação dos impostos sobre esses salários seria equivalente a 40 vezes o orçamento do CNPq -Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico em 2022, órgão responsável por toda a pesquisa científica do Brasil, inclusive bolsas de estudo para estudantes

João Gabriel também lembrou que o mercado ilegal tem um impacto duplamente negativo. Primeiro quando deixa de ganhar em impostos, geração de empregos e renda e segundo quando o comércio é deixado sob controle do mercado ilegal, que além de não oferecer ganhos ao país, apresenta perdas através da violência, financiamento de outras iniciativas criminosas e falta de qualquer apoio ou proteção aos consumidores: “nós temos um mercado independente da proibição ou não, na qual a demanda hoje é suprida integralmente pelo mercado ilegal, pelo contrabando. Todo o mercado ilegal é extremamente nebuloso, não se sabe o que acontece ali, não há uma regulação sobre ele. Possivelmente ocorre uma série de crimes, desde brandos como corrupção até violentos, produzindo impactos negativos para a sociedade como um todo.” disse Gabriel.

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