Novo projeto de lei quer regulamentar os cigarros eletrônicos no Brasil para proteger os jovens

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De autoria da Senadora Soraya Thronicke (PODEMOS/MS), o projeto de lei Nº 5008, de 2023 propõe uma nova regulamentação para os cigarros eletrônicos no Brasil, cujo comércio, importação e propaganda são proibidos desde 2009 pela RDC 46 da Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

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O cenário atual

Apesar de uma regulamentação proibitiva existir há mais de 14 anos, o comércio e consumo ocorrem em larga escala, com produtos sendo oferecidos nos mais diversos locais como casas de show, tabacarias, ambulantes e lojas especializadas na Internet.

A oferta acompanha a demanda, já que o país vê um aumento exponencial de consumidores. Um levantamento recente do IPEC — Inteligência em Pesquisa e Consultoria — apontou que o uso desses produtos no país quase quadruplicou em 4 anos. Em 2018, eram aproximadamente 500 mil pessoas e em 2022 foram identificados mais de 2,2 milhões de consumidores.

O IPEC também informa que dentre os fumantes, quase 6 milhões já experimentaram os cigarros eletrônicos.

Esses números refletem os dados da Receita Federal, que mostram que as apreensões de contrabando desses produtos saltaram de R$ 2,2 milhões em 2020 para R$ 34,8 milhões em 2021, um aumento de 1.400%. Em 2022 os números se repetiram, com outros R$ 34,36 milhões em apreensões, totalizando R$ 68 milhões nos últimos dois anos.

Todo esse consumo é feito através de um mercado 100% ilegal, sem qualquer controle sanitário ou de segurança, sem regras para fabricação dos produtos como limites de nicotina ou ingredientes, o que possibilita o uso de produtos impróprios e abre margem para contaminações.

Mais de 110 países já regulamentaram os produtos, com exemplos como a Inglaterra, que tem incentivado adultos fumantes a trocar os cigarros convencionais pelos eletrônicos, em um programa chamado “Swap to quit” (“mude para parar” em tradução livre) que prevê a distribuição gratuita de 1 milhão de cigarros eletrônicos para adultos fumantes. A Suécia é outro caso emblemático, que está prestes a se tornar o primeiro país no mundo a ser oficialmente “livre do fumo”, de acordo com a OMS – Organização Mundial da Saúde – atingindo um patamar de apenas 5% da população fumante, declarando publicamente que este feito não poderia ter tido sucesso sem a ajuda dos cigarros eletrônicos.

No Brasil, a Anvisa passou a discutir uma possível mudança desde 2019, realizando consultas públicas e tomadas de subsídios, analisando as mais recentes pesquisas, como a maior revisão científica já realizada até hoje, feita pelo Royal College of London, que analisou mais de 400 estudos e concluiu que os cigarros eletrônicos oferecem apenas uma pequena fração dos riscos de fumar, mas até hoje a agência não decidiu à respeito.

Foco da nova lei é a proteção aos jovens

Não há dúvidas que o mercado ilegal de cigarros eletrônicos no Brasil apresenta um impacto incontrolável na saúde das pessoas, mas a maior risco recai sobre os jovens. A receita de um comércio ilegal é bastante simples, para alguém cuja única preocupação é se esconder da fiscalização, busca-se equilibrar esse risco com a venda de produtos com grande margem de lucro, sem qualquer obrigação com custos de controle sanitário, qualidade, segurança ou garantia ao consumidor. Além de garantir a margem de lucro, é preciso vender rápido, portanto há oferta para qualquer pessoa, seja fumante ou não, maior de idade ou não.

Considerando os dados da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar de 2019: 16,8% dos adolescentes de 13-17 já experimentaram esses produtos. Já o Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia, Covitel 2023, indica que aproximadamente 1 a cada 4 jovens de 18 a 24 anos no Brasil (23,9%) já utilizou alguma vez um cigarro eletrônico. A tendência é de alta, no ano passado esse percentual era de 19,7%, ou seja, 1 a cada 5 indivíduos na faixa etária. O crescimento, em apenas 12 meses, foi de 21,3%.

Os dados mostram claramente que a mera proibição do comércio e importação não está funcionando. Agora, o legislativo toma a iniciativa de apresentar uma alternativa que proteja os jovens, enquanto permite acesso a produtos adequados aos adultos fumantes.

Principais pontos da nova lei

O texto estabelece a permissão do comércio, fabricação e importação em todo o território nacional, deixando claro que a propaganda é vedada, exceto no ponto de venda, exatamente como já ocorre com os cigarros convencionais. Medidas para proteger os jovens estão em todo o texto, com destaque para a proibição de sabores apelativos que remetam a doces e sobremesas e embalagens chamativas com desenhos e temas infanto-juvenis. Apesar disso, serão permitidos sabores de frutas, que pesquisas comprovam que são os preferidos dos adultos, além de tabaco, mentolados e similares.

Destaque para o Art.24. que prevê multa mínima de R$ 10.000,00 e máxima de R$ 10 milhões de reais para aquele que oferecer, direta ou indiretamente, um produto de cigarro eletrônico para menores de 18 anos.

Para proteger o público consumidor adulto, são impostas várias regras, entre elas: limite máximo de nicotina de 35 mg/ml, volume total de 22 ml nos frascos de líquidos, utilização de aditivos com alta pureza e até critérios não sanitários de qualidade, como registro no Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para segurança no carregamento dos produtos e na Anatel, para produtos que tenham tecnologia bluetooth ou outras tecnologias sem fio similares.

O texto também contempla garantir que a informação adequada seja um ponto chave no comércio dos cigarros eletrônicos no Brasil. Os produtos deverão conter todas as informações e avisos de segurança necessários, como instruções para uso e armazenamento, contra-indicações, possíveis efeitos adversos, lista de ingredientes e advertência sanitária.

Apesar da propaganda ser proibida, a informação técnica e científica é garantia na lei, permitindo a divulgação de publicações com cunho estritamente informativo e de debate científico e social de dispositivos eletrônicos de cigarros eletrônicos, desde que sem menção ou exposição, direta ou indiretamente, de marca comercial de cigarro eletrônico. Isso é essencial para manter a população devidamente informada sobre os produtos e continuar monitorando a impacto dos cigarros eletrônicos na saúde pública, estratégia adotada em países como a Inglaterra, que recentemente passou a revisar suas leis e fazer adequações.

Apesar disso, há críticas ao texto, como a proibição dos chamados “sistemas abertos”. Os produtos de cigarros eletrônicos podem ser divididos em duas categorias básicas, “sistemas fechados” são aqueles em que não é possível fazer o refil do produto, enquanto os “sistemas abertos” permitem que o consumidor faça o refil de um cartucho com o líquido de sua preferência.

Ambos possuem vantagens e desvantagens. Do ponto de vista prático, um “sistema fechado” seria mais seguro, pois impede que o consumidor coloque produtos inadequados ao consumo. Porém, especialistas declaram que proibir o “sistema aberto” apenas impedirá que esta opção seja oferecida de forma legalizada, o que acabará por alimentar o mercado ilegal, pois é um tipo de produto muito utilizado pelos consumidores.

A segunda crítica está no valor de registro dos produtos. O PL estabelece um custo de registro na Anvisa no valor de R$ 100.000,00 por produto, um valor muito alto para iniciativas de pequeno porte, o que pode gerar uma concorrência desleal no mercado, permitindo que somente grandes empresas possam oferecer seus produtos. Da forma como está, o texto vai impedir que muitas iniciativas comerciais ilegais que existem hoje no Brasil possam se regularizar, o que pode acabar por manter uma boa parcela do comércio ilegal ativo.

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